sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A solidariedade militar

Diz-se que no tempo militar se criam amizades que ficam para toda a vida. Eu penso que não é bem a amizade o principal elo de ligação para toda a vida mas a solidariedade que fica depois de se partilhar um tempo tão intenso. E o exemplo que eu talvez possa dar mais significativo é o do que ficou, passados tantos anos, em relação ao capitão da nossa companhia. Não foram fáceis as relações com ele: um herói, um militarão, um voluntarista ainda por cima sem a experiência, que vem com a idade, que faz diminuir o voluntarismo. Eu serei o contrário de tudo isso. Além disso a principal característica da minha educação foi o da uma enorme liberdade, sem controles, apenas com avisos tipo – Olha que se não fizeres isto ou aquilo vais-te dar mal no futuro. Nunca com ameaças e sempre permitindo a argumentação contrária. A tropa não é nada disto: manda quem pode, obedece quem deve e ponto final. Foi um choque enorme a ida para a tropa! O capitão era para mim, sobretudo no princípio e depois em alguns outros períodos da comissão, a encarnação do mal que me atacava. Mas, no fundo, sempre achei que era melhor estar com alguém que sabia do ofício do que com um amador qualquer e, por outro lado, eu achava que o comandante sempre nos protegeria, a todos, de eventuais excessos do capitão, que aliás acabaram por nunca se verificarem. O que ficou de tudo isto, quase imediatamente depois do fim da comissão? Uma enorme solidariedade. Uma grande admiração pelas suas qualidades militares e uma certa pena por ele ter tido de aturar milicianos como eu: inexperiente, sem gosto nem jeito para o ofício, um rapazola em formação. Pior era impossível!
Quem neste ambiente terrível, sobretudo no início da comissão como por diversas vezes já escrevi, salvava a situação? A amizade entre os alferes que mantive do princípio ao fim, com um ou outro pequeno percalço com o Guia de que não fui o actor principal mas estava solidário com ele, e a companhia na conversa e na discussão amiga do capelão e do médico. Lembro uma noite em que a discussão foi tão intensa que escrevi no meu diário “o capelão e o Chaves são racistas!” coisa que evidentemente nunca foram mas eu talvez gostasse que eles fossem para ganhar argumentos!

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