segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Uma das regras essenciais que se deviam seguir para manter o que se chamava “o moral” das tropas era mantê-las ocupadas. O comandante e o capitão eram grandes adeptos dessa regra, creio que com razão, e por isso, mesmo estando no quartel sem nada para fazer era sempre preciso “inventar” qualquer coisa.
Lembro até que no Niassa, além de fazermos formaturas em espaço mais do que exíguos, fizemos sessões de ginástica rudimentares.
No quartel as “formaturas” para impedir que se ficasse preguiçosamente na cama eram às oito da manhã e às três da tarde. E nessa ocasião era apresentado o programa da manhã ou o da tarde para quem ficava no quartel. O trabalho mais comum foi o de “capinar” à roda do arame farpado para que o capim não servisse de esconderijo a eventuais assaltantes que, se tivessem existido, teriam tido que passar um espaço considerável de campo aberto, antes de atingirem o arame farpado. Outro trabalho foi o das obras. O capitão gostava de obras. Gostava de “melhorar” o aquartelamento. E o que é facto é que teve a arte de conseguir arranjar material para obras consideráveis no Mucondo. Quando de lá saímos deixámos mais duas, que me lembre, casernas. O meu pelotão tinha uma data de especialistas em “obras” e tinha, além disso, vontade de ficar com uma das casernas que foram construídas. Foi assim que “negociei” com o capitão que se as obras fossem feitas em passo de corrida o terceiro pelotão ficaria com a primeira caserna feita. Assim foi mas com um enorme percalço: as obras foram tão rápidas, feitas com tanto entusiasmo, que por duas vezes a parede levantada no dia anterior foi abaixo durante a noite com uma qualquer rabanada de vento. Felizmente o capitão foi razoável e lembro-me de lhe ficar grato, sem lho dizer, claro, por considerar ossos do ofício as paredes irem a baixo e portanto os atrasos daí decorrentes não contaram para a ocupação da caserna nova (e boa)
Relacionado com isto e talvez sem interesse para este blog o facto de o capitão ficar furioso comigo por eu não acompanhar a construção civil. Mas eu entendia que o Justino e o Gonçalves faziam melhor papel do que eu, como aliás em muitas outras coisas, e passava essas tardes ou manhãs a ler deitado na minha cama, interrompendo a leitura de vez em quando para averiguar se estava tudo bem, coisa que naturalmente estaria.

1 comentário:

  1. Outra ocupação foi a das aulas regimentais , mas disso falarei mais tarde.
    Aprendi desde pequeno, na casa dos meus pais, que o ócio é o pai de todos os vícios e por isso achei sempre de boa medida a ocupação de todo o pessoal da companhia. Foi uma atitude sábia e tanto quanto sei deu frutos que foram muito para além do tempo da comissão. Em vários contactos soube de camaradas que se fizeram construtores civis e ao que consta muito bem sucedidos.
    Pena é que não tenhamos hoje, aqui e agora, líderes que perfilhem tais ensinamentos e tenham coragem para ocuparem quantos estão desocupados e vivem do erário público, teríamos um outro Portugal e talvez estivéssemos , ao menos dentro da média de desenvolvimento da UE em vez de estarmos neste buraco.

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