terça-feira, 26 de outubro de 2010

A última operação

Voltando às operações. Por mais pequenas que elas fossem eram sempre uma preocupação. Ao princípio por causa do desconhecido e a probabilidade de morte eminente, depois por causa da enorme incomodidade que elas representavam. A maior parte das operações eram feitas ao nível de pelotão, às vezes dois. Raramente três. O capitão ia em muitas mas, naturalmente, não ia em todas. Ao princípio claro que era melhor ir com o capitão, pelas razões que já escrevi. Depois passou a ser melhor ir sozinho ou com o pelotão do Chaves, o segundo, com quem sempre me entendi muito bem, embora sempre me tenha entendido bem com todos. O Chaves e eu, suponho que os outros também, tínhamos a mesma concepção de guerra: quanto menos índio, menos guerra e portanto não estávamos ali com um zelo danado à procura do IN (inimigo). Foi assim que sempre que foi possível a guerra foi diminuída ao mínimo mas, diga-se a verdade, a enorme maioria das vezes não era possível porque o comando não era parvo e planeava as operações de forma a ser quase impossível não as cumprir. A maneira mais fácil de conseguir este objectivo era entrar na mata num determinado ponto e sair numa outra picada paralela e nunca no mesmo ponto. Assim teríamos sempre que avançar até ao ponto de recolha. Apesar de ser essa a regra, uma ou outra vez assim não foi sendo o local de recolha o mesmo da largada ou muito perto dele. Lembro pelo menos duas ocasiões, mas penso que houve mais. Uma com o Chaves em que reduzimos a operação a um passeio, ficcionando tudo o resto pela rádio e a outra, foi precisamente a última operação que fizemos com uma quantidade enorme de tropas envolvidas, com o brigadeiro da Região Militar a sobrevoar-nos em avião DO e nós instalados na margem de um rio de que não lembro o nome, a pouquíssimos metros da picada, escondidos pela ramagem da floresta durante três noites e quatro dias e transmitindo falsas localizações pelo Racall. Lembro sobretudo o momento de enorme irritação que senti, quando a condição de silêncio era absolutamente indispensável e, apesar disso, ouvir o grito irreprimível de “goolo!” que os soldados emitiram ouvindo o relato do Benfica qualquer coisa no transistór! Na altura pensei que não tínhamos condição de fazer nem mais uma operação porque o à vontade de veterano manifestava-se irresponsavelmente! E a propósito registo que o capitão por vezes desconfiava do nosso zelo militar e então, nas nossas costas, inquiria dos soldados o que se tinha passado. Nunca fomos apanhados, graças a Deus!

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