domingo, 30 de janeiro de 2011
"Cumprimentar o Amaral"
Fiquei contente e por isso puxei pela cabeça e fui procurar uma foto nossa, que publiquei juntamente com o meu último capítulo, para te ajudar a avivar a memória.
Um abração do ferrugento.
"Como eu entrei na Guerra"

A única mulher que havia era a lavadeira, velha como ou caraças e desdentada, que não sei se acabou ou não por dançar. Mas toda a maçaricada que dançou, incluindo oficiais e sargentos, ainda hoje é capaz de jurar que dançou com uma mulher. Não há dúvida que os negros tinham um jeito muito especial para se vestirem de mulher.
Com o aproximar da noite começou a formar-se a coluna militar que iria levar todos os companheiros à fazenda.
De pé ao lado do condutor do unimog, de peito feito às balas lá ia eu farolinando à procura de vislumbrar os olhos dum veado ou duma pacaça, até que dei mesmo com eles e mandei parar a viatura.
Chegámos ao Bombo. Na altura eu não deixava as coisas em meio, fui ter com dito cujo e perguntei-lhe o que é que se tinha passado e qual a razão que o levou a ofender-me. Fiquei então a saber que havia possibilidades de estar preparada uma emboscada, tendo em conta indícios que a coluna que tinha vindo do Zemba com o correio tinha detectado.
"Como eu entrei na Guerra"
Capítulo 15 º
A rotação do descontentamento
Páscoa de 1971. Apenas estavam no aquartelamento os aramistas e alguns operacionais doentes ou com problemas físicos tipo esquentamentos, matacanhas, paludismos, preguiça, etc. etc.
Uma avioneta a sobrevoar o aquartelamento e a indicação de que a mesma ia aterrar, sendo necessário garantir a segurança à pista.
Iria ser o meu 3º contacto com o Comandante do Batalhão Tenente Coronel Duarte Silva.
Lembro-me como se fosse hoje. As palavras que proferiu ainda estão gravadas na minha cabeça e nem com o passar dos anos me consigo esquecer.
Todo o pessoal presente no aquartelamento, excepto os acamados e os sentinelas, formaram em frente ao refeitório dos soldados e foram estas as palavras do Comandante.
- “Fui chamado a Luanda ao Quartel General e graças aos êxitos do nosso Batalhão no Norte de Angola ofereceram-me a intervenção e eu, certo de que ia de encontro aos vossos sentimentos aceitei”.
De encontro a que sentimentos? Quem é que nos ouviu ou se importou com a nossa vontade? Que tristeza…
Foi um balde de água fria que caiu sobre a minha cabeça e da dos meus companheiros de armas, pois estávamos tão longe de pensar a traição que nos faziam. Não havia dúvida de que não passávamos de carne para canhão ao sabor dos interesses pessoais dos senhores da guerra.
Lembro-me de mandar destroçar todo o pessoal, que de cabeça baixa recolheu às suas instalações pois os destinos que sonhavam e que estavam em aberto para a segunda parte da comissão tinham-se esfumado.
Nesta fase fiquei de cabeça perdida e desalinhei por completo.
Clemente Pinho. Ex-Furriel Mecânico Auto. C.Cav. 2692
segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
"Como eu entrei na Guerra"
É Carnaval. A Guerra pode esperar...
Carnaval de 1971. Eu, o Gomes, o Leitão e Aragão Pinto resolvemos dar um pontapé na monotonia e providenciar uma cegada das antigas e brincar ao carnaval, matando assim saudades da nossa vida de civil.
"Como eu entrei na Guerra"
Capítulo 13º
Pinho e Pina Silva a aprenderem a tocar violaMotor de arranque não tinha e era posta a trabalhar de empurrão. A caixa de velocidades dava para enfiar algumas mudanças que arranhavam de tal ordem que até nos punham os cabelos em pé, travões apenas o de mão.
Escoltados por um pelotão da tropa de elite da C.Cav. 2692, arrancámos direitos a Quibaxe com a GMC devidamente engatada a uma das Berliet , através de uma lança de reboque.
Dentro da cabine, eu a conduzir e o Pina Silva como ajudante com a missão específica de accionamento do travão de mão, único acessório que funcionava mais ou menos embora com risco de incêndio, devido ao atrito nos calces de travões, lá conseguimos chegar sem sobressaltos de maior até à descida para o Dange.
Porque se tratava de uma zona com um declive muito acentuado tratei de prender um cabo de reboque a uma outra Berliet, que coloquei na traseira da GMC e atacamos a descida.
Com a GMC devidamente entalada entre as duas Berliet carregadas de companheiros de luta, fizemos no máximo uns quinhentos metros quando, para mal dos meus pecados, o cabo que aguentava a minha viatura se partiu e a pressão sobre a Berliet da frente foi de tal ordem que dobrou a lança e só não foi tudo morro abaixo porque num golpe de génio (sorte) consegui enfiar por debaixo da traseira da Berliet a frontaria da GMC e, ao fim de alguns metros de arrastamento conseguimos imobilizar-nos junto do precipício.
Deus esteve connosco naquele momento.
Fiquei sem pinga de sangue e a partir daí já nem o Pina Silva me quis acompanhar na viagem. Lembro-me que as pernas ainda me tremiam quando cheguei a Quibaxe e nem vontade tive para ir “mudar o óleo”, coisa que normalmente fazia sempre que ia ao Pelotão de Apoio Directo.
De facto a evacuação da GMC foi um risco mal calculado, que nos poderia ter saído muito caro.
Mas enfim, haja quem mande. Só nos resta obedecer.
E vai um faducho
Clemente Pinho. Ex-Furriel Mecânico Auto. C.Cav. 2692
"Como eu entrei na Guerra"
Capítulo 12º
Emboscado na lixeira. A segunda aventura fora do arame.
Altas horas da noite na ferrugem, condutores , mecânicos, telegrafistas e outros aramistas, cantavam e pulavam ao som da sanfona do Ramos e do barulho ensurdecedor de ferros e latas, com muita cerveja, whisky e brandy à mistura. Havia alguém que fazia anos, não tenho presente quem. Eu não era de certeza pois vim sempre passar os meus ao “puto”, de férias claro.
É possível que tenham batido à porta. Com aquele barulho infernal só conseguimos aperceber-nos dessa situação quando começaram a querer deitá-la abaixo . Nessa fase já alguém gritava que batessem com os cornos e quando fomos ver quem era demos de caras com o Taxa Araújo que, devido ao barulho (o coitado estava com insónias) não conseguia pregar olho.
O Pinho indigitado para comparecer de manhã no gabinete do capitão e, como o mal estava feito a festa continuou até o sol raiar.
Resultado da ida ao gabinete. Uma emboscada à lixeira para essa noite em que participariam todos os aramistas presentes na farra.
E assim foi. Orientei as coisas para uma participação rápida no evento, pois duas noites sem dormir é que não dava, era areia demais prá minha camioneta.
Saímos a pé direitos à lixeira, não sem antes desligarem todas as luzes do aquartelamento, que só voltaram a acender depois de nos instalarmos devidamente à roda da lixeira. G 3 nas unhas, devidamente camuflados, de olhos postos no teatro de operações, em parte iluminado pelas cinzas do forno da padaria que o vento reacendia momentaneamente.
Ainda não tinha decorrido uma hora, perfeitamente de acordo com o previamente combinado, dei inicio ao conflito com uma rajada de G3, a que se seguiram outras igualmente programadas e um ou dois rebentamentos de granadas.
Passados 10, 15 minutos já tínhamos o Taxa Araújo e a sua tropa de elite, tal major valentão a perguntar “quantos são, quantos são”.
Claro que não era nada mas todos os aramistas confirmaram e juraram, ter visto qualquer coisa a movimentar-se na lixeira. Até podia ser um javali, quem sabe…
O Capitão nunca se convenceu mas o que é certo é que ainda não era meia-noite e a maior parte de nós já estava nos lençóis.
Alinhava, desalinhava. O que importava era que os dias iam passando e eu me ia divertindo conforme podia.
Clemente Pinho. Ex-Furriel Mecânico Auto. C.Cav. 26292
Histórias da nossa tropa
seriam as outras. Por falar nisso recordo uma situação que agora vou partilhar.
Poucas pessoas sabiam que quando das ditas operações do G.G. ou Sector, eu como Furriel
recebia um envelope com instruções da minha area enquanto oCap. recebia outras,não sei se
iguais ou não.Quis o destino que ao receber instruções as pessoas que as elaboraram fizeram
uma troca, isto é: Para o Cap. a C.Cav 2692 era azul.
» Gomes » » » verde
Quando da reuniam prévia O Cap. começou a ler,pedindo antes para corrigir-mos algo que
não estivesse bem. A 2692 é grupo azul ao que eu respondi:verde passadas outras situações identicas o Taxa que não gostava de ser contrariado avança para mim,com que intenções eu
não sei.... só sei é que me passou algo cabeça que até desmaiei(talvez fosse a minha sorte).
Quando me passou a filoxera, fui directo ao gabinete ,pedi para entrar e disse : estam aqui
as provas, é verde ou não é? ao que o Taxa rendeu: tenho aqui os papeis somos o grupo azul
ou não? Tinhamos sido vítimas dos profissionais do C.G. ,isso não impediu o homem de me
chamar malcriado e me prometer um porrada.
Lá no fundo ele reconheceu que se houve alguem incorrecto foi ele......
Tanto que me mandou ir com o 1º Sarg. receber os vencimentos, foram uns dias em Luanda
que eu ainda hoje me lembro (talvez um dia eu conte).
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
"Como eu entrei na Guerra"
"Como eu entrei na Guerra"

Capítulo 10º
O Jipe e a “bola de bilhar”
Jantar de despedida do Alferes Cabrita
A vidinha de aramista até nem era nada má. Trabalhar o necessário, escrever prá família e ir bebendo a cerveja que podia e o whisky “novo” que me calhava mensalmente como sargento, pois o velho ou o especial estava apenas destinado aos oficiais, discriminação que nunca compreendi.
Com o Capitão de férias no “puto” o Alferes Guia, penso que por ser o mais antigo, ficou a comandar a companhia e para se impor ou por defeito procurou imitar a forma de comando do Taxa Araújo.
Como tal era digno de se ver o dito cujo montadinho no Jipe passeando por tudo quanto era sítio dentro do aquartelamento, matando saudades dos seus tempos de civil.
Para mim não havia qualquer problema, tanto de me dava que fosse o Guia a utilizar a viatura do comando ou o Passarinho, que era o seu condutor. O que eu tinha a certeza era que não tinha recebido instruções directas relacionadas com a utilização do jipe do capitão.
Passados talvez uns quinze dias depois do Taxa Araújo ter regressado de férias o Passarinho, condutor do Jipe” foi chamado ao gabinete do Capitão para explicar a razão porque deixou o Alferes Guia utilizar a viatura e quando de lá saiu, veio ter comigo a informar-me do que se passava e de que tinha recebido como castigo uma “carecada”.
Depois foi a minha vez de ser interrogado sobre o acontecimento e por mais que eu fizesse ver ao Taxa que nem eu nem o meu condutor tínhamos responsabilidades sobre o acontecimento, pois para todos os efeitos o Guia era na sua ausência o comandante do aquartelamento, o tipo não foi cá de meias medidas e mandou-me também cortar o cabelo à máquina zero.
Ainda o Gato, que era o barbeiro, me estava a tirar as medidas à cabeça já todo o aquartelamento sabia que eu tinha apanhado uma careca e iam passando pela barbearia, em romaria, para verem a obra de arte que ia dali sair.
Nunca fui de meias medidas e apareci no gabinete do Taxa com a cabecinha de tal modo escanhoada que mais parecia uma autêntica bola de bilhar. Fui repreendido por ter exagerado no corte, pois não tinha que ser tão curto. Preso por ter cão, preso por não ter…
Estive vai na vai para o mandar prás obras. Tive que me conter pois ainda faltava muito para acabar a comissão.
Sinceramente em toda esta brincadeira, a única pessoa com quem de facto fiquei na altura chateado, depois passou, foi com o Alferes Guia que deveria ter tido a coragem de enfrentar “a fera” , fazendo-lhe ver que a responsabilidade era totalmente sua.
Por vezes eu alinhava mas aparecia sempre qualquer coisa para me desalinhar.
Clemente Pinho. Ex-Furriel Mecânico Auto. C.Cav. 2692
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
"Como eu entrei na Guerra"
A primeira aventura fora do arame.
Metemo-nos os dois no jipe e fomos ao encontro de um dos nossos pelotões que estava a ajudar a desimpedir e reparar um antiga estrada que saía à direita do campo de futebol, junto à lixeira.
Há medida que nos íamos aproximando começamos também a encontrar cunhetes de munições por utilizar, granadas por rebentar, invólucros, testemunhos de uma traiçoeira emboscada que poderia ter sido para nós.
Ultrapassado o espanto inicial, não sei porque carga de água o Capitão resolveu correr mato a dentro à procura do inimigo, o que originou numa perseguição desenfreada que só acabou quando, completamente exaustos, nos deitamos por terra debaixo da ponte que fazia a ligação à fazenda.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
QUEM SE LEMBRA DO CARLOS GOMES DA CCAV 2690?

Não será frequente usar o nosso blogue para divulgar notícias de outras Companhias. No entanto, decidi fazê-lo neste caso concreto, por razões que adiante se perceberão.
Um primo do nosso camarada Carlos Alberto Ferreira Gomes (que foi Atirador de Cavalaria da CCav 2690, integrando o 4º Pelotão) contactou-me recentemente solicitando informação sobre os locais percorridos por aquela Companhia, uma vez que tem feito um trabalho sobre os militares da terra que estiveram na guerra e por gostar também que o seu primo contacte mais vezes com os antigos camaradas.
O referido primo sentiu necessidade de recorrer a mais pessoas dado que o Carlos Gomes sofreu um AVC há cerca de dez anos e não consegue falar nem escrever, apesar de estar completamente lúcido e reconhecer as pessoas do seu relacionamento, incluindo obviamente os seus ex-camaradas de armas.
Já tive oportunidade de visitar o Carlos Gomes, cuja esposa me emprestou as fotografias que aqui insiro (a seguir uma vista do aquartelamento de Zemba e do pessoal do 4º Pelotão da 2690).

Assim, peço a quem conheça o Carlos Gomes, nomeadamente aos que pertenceram àquela Companhia, que deixem o seu contacto no endereço de correio (e-mail) do nosso blogue para que possam oportunamente entrar em contacto com o Carlos que, apesar de ter ido aos almoços da Companhia, gostaria de ver mais vezes os seus ex-camaradas.
Aqui fica o apelo.
António Gonçalves
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
"Como eu entrei na Guerra"
A vida de um aramista que de mecânico auto apenas tinha o nome.
Mecânico auto eu? Estava a guerra bem arranjada se estivesse à espera que eu mexesse uma palha para reparar alguma viatura.
Era de facto uma vida de combatente das antigas em que apenas desalinhava quando me chamavam de aramista. Aí de facto tiravam-me do sério pois eu não me chateava nada de sair para o mato, pois de certeza que não escondia a cabeça num buraco como as avestruzes e nem vinha às cavalitas dos guarda-costas chorando baba e ranho.
sábado, 8 de janeiro de 2011
Histórias da nossa tropa
Isto a proposito da Cantina que o Pinho recebeu dos "velhinhos". Como todos sabemos,para o nosso Cap.
apenas contavam os atiradores.não interessava quem tratava de orientar a manutenção da comida,das viaturas,do Posto médico isto já para não falar das transmissões que só eram importantes quando havia
necessidades , estou a lembrar-me por Ex: quando oCarvalho comeu os cogumelos venenosos e outras.
Mas voltanto á Cantina,quando se chegou ou melhor quando me foi imposta a responsabilidade sobre
a dita, foi-me dito: Gomes vái tomar conta das cantinas e vai prestar esclarecimentos ao Alf. Vieira.
Claro que quando chegou o 1º Pereira e foi conferir todos os géneros da cantina e verificou que nada
correspondia ao que devia ser.
Aí já o Gomes era o responsável maximo porque a Classe dos oficiais tinha de ser portegida.
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quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
"Como eu entrei na Guerra"

Capítulo 7º
desperdício. Herança da companhia rendida